sábado, 14 de novembro de 2009

DA DESUMANIZAÇÃO

O que é você? O que é uma forma de vida?
Como você interpreta a sensação do toque frente à desilusão de que o seu corpo é formado de partículas que repulsam umas à outras e jamais encostam-se?
Qual volume sua mente ocupa no espaço?

Os seres vivos terrestres estão sempre vinculados a formas de manifestação que permitem a sua comunicação com o ambiente circundante e o ambiente intrínseco. À essas formas chamarei de Leis da fenomenologia da caracterização da consciência.
A primeira das formas é a sensação. A sensação é o fator que permite a aquisição de informações do meio externo e interno. A sensação é a capacidade do ser de sentir e experimentar os fenômenos diversos.
A segunda das formas é a racionalidade. A racionalidade é a capacidade de interpretação e julgamento, o discernimento. É a capacidade de lidar com as informações, analisá-las, guardá-las e alterá-las.
A terceira das formas é a identidade. A identidade é a capacidade de reconhecimento da própria racionalidade e da própria sensibilidade, entendendo que ambas as manifestações são por si experimentadas através da mesma sensibilidade e praticamente incomunicáveis a outras manifestações de sensibilidade, tornando praticamente intangíveis e intransferíveis as sensações e pensamentos alheios.
A conjunção de todas essas manifestações, cada qual com seu determinado nível de relevância - sendo a sensação independente da racionalidade e identidade, a racionalidade independente apenas da identidade e a identidade dependente das duas outras - é o que caracteriza a consciência.
Mas as velhas questões ficam. Onde termina e onde começa a consciência? Deveria a vida, sob qualquer circunstância, estar sempre vinculada à essas manifestações, qualquer que seja a forma de vida da qual se trate?
Considerando apenas as formas de vida que conhecemos, podemos hipotetizar a respeito da plasticidade individual, que consta na manipulação da própria identidade por um determinado ser.
Ora, a nossa racionalidade está atrelada à cognição, que é fundamentalmente dependente da nossa capacidade física de processamento de informações (e o é provavelmente para todas as outras formas de vida conhecidas). Nesse caso, fácil se torna nos desligarmos da concepção de enclausuramento à forma. Em nossos cérebros reside meramente a capacidade de emulação da racionalidade e intercomunicação entre a fenomenologia da manifestação da vida e o meio material em que nossos corpos se encontram. O cérebro não é uma forma que define o tipo de vida que se manifesta no ser - até onde a ciência consegue compreender, todas as formas de vida são manifestadas de acordo com os três fenômenos de caracterização da consciência (mesmo que possam não apresentar integralmente todos os três), sendo o sistema nervoso apenas um canal de comunicação entre os fenômenos físicos e os fenômenos espirituais (entenda-se por espírito a mente).
Dessa forma, ao nos reservamos apenas à nossa condição de manifestações da vida regidos pelas leis da fenomenologia da caracterização da consciência, podemos ignorar os aspectos que nos conferem identidade pessoal, taxonômica, social, e de qualquer outro tipo que extrapole os sentidos das leis. A racionalidade nos confere a plasticidade necessária para ignorarmos as limitações físicas que os nossos corpos nos imprimem e fazermos funcionar em nós mesmos os fenômenos básicos de manifestação da vida, perdendo, então, nossa identidade como humanos e nos tornando livres para assumir qualquer identidade com a qual os três fenômenos que nos caracterizam possam se comunicar diretamente. Isso pode acontecer, e em um baixo nível, por exemplo, através da transferência da mente de um corpo físico para outro. Em um alto nível, poderia ocorrer a total reconfiguração de como a manifestação individual da vida se intercomunica com o meio e consigo mesma.