sábado, 15 de fevereiro de 2014

SOBRE A EXTENSÃO DA SUA INFLUÊNCIA

Recentemente, abordagens holísticas tem ganhado pauta em muitos aspectos culturais humanos. Especialmente com a ascensão da ecologia e da conservação ambiental, nós temos tentado cada vez mais medir o impacto de cada uma de nossas atividades através de toda a biosfera. Existem centenas de medições de parâmetros globais sendo realizadas a cada dia, istoé, existem milhares de aparelhos dos mais diversos tipos espalhados por toda a superfície terrestre fazendo medições de características climatológicas, meteorológicas, topográficas, geográficas e astrofísicas, e existem grupos de pesquisa fazendo censos locais em seus continentes de origem acerca de parâmetros sociológicos, psicológicos e políticos. Com a maturidade da inferência estatística e sua aplicação automática no método científico, relações cuidadosas e abrangentes tem sido feitas entre esses e outros parâmetros de áreas diferentes e diversas. Por exemplo, não é incomum ler manchetes do tipo "Pesquisadores descobrem relação entre taxa de escolaridade média e taxa de reciclagem de material reaproveitável".

Obviamente, isto não tem afetado apenas a pesquisa científica. A religião, a mídia e as forças econômicas todas tem se ajustado para comportar este novo tipo de pensamento. Existe um novo tipo de crença popular, muito oposto ao que se pensava apenas alguns séculos atrás, de que as ações de um único indivíduo podem ressoar por toda superfície do planeta ou até mesmo através de todo o tecido do espaçotempo e influenciar todas as coisas até mesmo à um instante indefinido na história. Existem muitas origens para esta crença. A descoberta de sistemas turbulentos e caóticos por pesquisadores como Lorenz, que estudava meteorologia nos anos 60 e descobriu a versão técnica e rigorosa do mal-interpretado "efeito borboleta", foi certamente um dos passos mais importantes. O lançamento da Teoria de Sistemas por Bertallanfy também ajudou a aproximar muitas áreas do conhecimento. Turing acelerou o aparecimento dos computadores e consequentemente da cibernética, abrindo espaço para a interação de profissionais de todas as áreas acadêmicas do conhecimento e até mesmo de alguns gurus da filosofia popular, como Huxley, Asimov e Sagan. Shannon, desenvolvendo a Teoria da Informação, também aproximou muitos campos do conhecimento e conectou pela primeira vez a energia do mundo físico com a informação do "mundo das ideias" (que é armazenada no nosso cérebro através de memórias). Ao mesmo tempo, pioneiros na área da psicologia e psicanálise como Skinner e Freud provaram que a psique humana em muitos de seus aspectos peculiares pode ser estudada de uma forma analítica sob o método científico.

Todo esse amálgama de conhecimento redundante nos levou a crer que elementos de um sistema de uma área do conhecimento podem influenciar elementos de sistemas de outras áreas. Mas, qual será o real limite disto, se é que ele existe? Até onde o bater de asas de uma borboleta pode influenciar o destino dos objetos à sua volta? Vamos primeiro analisar a metáfora do efeito borboleta. Esta metáfora foi elaborada para ajudar a nos referirmos ao regime caótico de alguns sistemas físicos. Em posts anteriores exploramos o significado de sistemas. Um regime caótico é um comportamento de um sistema ao longo do tempo em que ele exibe características pertinentes ao caos matemático. Esse caos pode (mas não necessariamente deve) ser encarado como uma formalização do conceito de caos ao qual estamos acostumados: um sistema caótico geralmente parece complexo e desordenado aos olhos humanos. Matematicamente, o caos não é rigorosamente definido, mas relaciona sintomas que podem ser detectados no comportamento de sistemas complexos e nos ajuda a explicá-los. Entre esses sintomas estão: forte sensibilidade à condição inicial à qual o sistema foi submetido (por exemplo, ao se colocar dois barquinhos de papel sobre uma corredeira, bem perto um do outro, é certo que as trajetórias dos barquinhos serão bastante diferentes apesar da origem próxima, e as trajetórias podem até se encerrar uma longe da outra); a história ou trajetória que o sistema descreve ao longo do tempo é praticamente imprevisível (mais uma vez, se colocarmos um barquinho numa corredeira, percebemos que a corredeira é tão turbulenta e existe tanta variação que é praticamente impossível dizer qual caminho exato o barquinho vai descrever); intuitivamente, essas são as duas principais características de sistemas caóticos. Mais alguns exemplos de sistemas caóticos incluem: o clima terrestre, as asas de um avião e o ar em volta delas, a dinâmica de algumas populações biológicas e o padrão de disparo de alguns neurônios do cérebro humano.

Vamos relembrar a metáfora aqui: "Um bater de asas de uma borboleta em Beijing pode causar um dia de chuva ou de sol no Central Park". Porque a metáfora do bater de asas foi elaborada? Foi para mostrar a importância de uma condição inicial. A condição inicial seria o vento gerado pela borboleta, que teria consequências amplificadas na atmosfera terrestre e imprevisivelmente acabaria afetando correntes de ar por todo o globo. É claro que esta metáfora tem limitações fortíssimas. Relembre que, na "definição" de caos, não falamos sobre amplificação em nenhum momento. Na realidade, o que precisa acontecer para que um sistema apresente comportamento caótico é que exista um estado do sistema que sirva como "estado de equilíbrio", só que de uma maneira tão complexa que o sistema nunca consiga realmente atingir este estado e fique transitando indefinidamente numa região histórica ao redor dele. A imprevisibilidade surge daí: o sistema nunca fica "quieto", ele nunca para de se "comportar mal", ele está sempre evoluindo e isto pode se dar de infinitas maneiras, a depender das infinitas condições iniciais. Portanto, estímulos pequenos como o bater de asas de uma borboleta podem até alterar um pouco as condições iniciais do "vento local", mas, já que de qualquer forma o sistema (a atmosfera) vai transitar em torno de um "estado de equilíbrio" que é inalcançável, mas bem definido, até que o bater de asas não vai ter tanta influência assim. Se ele não for muito grande, a história da atmosfera pode até ser diferente, mas não vai ser significativamente diferente: a influência pequena do bater de asas da borboleta vai ser absorvida ao longo das incontáveis interações com correntes de ar de outros eventos na atmosfera muito antes que o vento chegue ao outro lado do globo.

Portanto, podemos meio que por uma pedra sobre este tipo de influência universal: o efeito borboleta é real, mas o modo com que influenciamos o universo ao nosso redor geralmente é bem mais sutil e complicado do que a crença popular costuma colocar. Porque somos apenas uma parte de um sistema composto por milhões, trilhões, zilhões, incontáveis outros componentes, cada um com sua parcela de influência. Este é o ponto de vista da física clássica, determinística, onde todos os elementos tem características bem definidas e podemos "prever o futuro" se soubermos a posição e a velocidade de todas as partículas do universo. Basicamente, este ponto de vista não impõe limites no alcance da influência de um único indivíduo: dado tempo suficiente, ondas gravitacionais resultantes do movimento do seu corpo poderão atingir todos os cantos do universo. Mas existe a imposição sobre a magnitude dessa influência, que, para cada indivíduo, é fortemente contrabalanceada pela complexidade do mundo. Para realmente efetivar mudanças grandes e significativas na biosfera, indivíduos provavelmente precisam orquestrar ações em grandes números e de maneira sistemática, sendo quase sempre incapazes de, sozinhos, exercer influência significativa de longo alcance. Este ponto de vista é, portanto, bastante centrado na Teoria do Caos.

Mas existe outro paradigma no estudo de sistemas físicos: a física quântica. Ao contrário da física clássica e da física relativística, que são determinísticas, a quântica é probabilística. Isto quer dizer que, dados alguns problemas fundamentais como a posição e velocidade de uma partícula, ou as diferentes formas em que ela pode se encontrar, não é possível prever com certeza em que estado ela se encontrará no momento da observação: no máximo podemos dizer com que frequência a observaremos em um determinado estado. A física quântica não foi conciliada com a Teoria do Caos, nem com a Teoria da Relatividade, e geralmente se aplica a sistemas de escala subatômica. Outra característica fundamental da física quântica está no seu nome: ela admite que energia e informação são transmitidas de maneira quantizada, isto é, transferências de energia e informação são realizadas de maneira discreta, em unidades básicas bem definidas, em pacotes (quanta) de magnitude regular e restrita. Por exemplo, se incidirmos a luz de uma lanterna sobre uma placa de metal, fótons partirão da lâmpada e poderão ser absorvidos pelos elétrons da placa. Se a luz for muito fraca, os fótons serão de baixa energia e não conseguirão ser absorvidos pelos elétrons. Não importa que eles cheguem perto da energia necessária, eles precisam ter uma quantidade fechada bastante exata de energia para excitar esses elétrons. Alguma energia a menos e eles são refletidos pela placa. Alguma energia à mais e eles irão interagir de outra forma com os átomos metálicos da placa, ao invés de serem simplesmente absorvidos. Na física clássica, em contrapartida, que considera o feixe de luz como um objeto "contínuo", um aumento proporcional na intensidade da luz da lanterna leva a um aumento proporcional no aquecimento da placa metálica.

Devido à essa natureza discretizada, quantizada da física quântica, somos dotados de um novo ponto de vista para analisar a influência de um indivíduo sobre o seu meio. O caos e a turbulência já não se aplicam facilmente. Para começar, vamos tratar da forma mais simples de influência: transferência de informação. Neste contexto, uma transferência de informação é constituída quando uma alteração no estado de um sistema está correlacionada com a alteração no estado de outro sistema. Por exemplo, se você vibra uma corda no violão, um ouvinte receberá o sinal sonoro e o seu estado mental mudará para comportar a informação de uma nota musical. A propagação desse sinal sonoro se dá da seguinte forma: devido à corda ter sido vibrada num espaço tridimensional, o sinal sonoro se espalhará com a mesma velocidade inicial em todas as direções a partir do epicentro da vibração (vamos supor sem perda de generalidade que o sinal se origina de um único ponto). Dessa forma, a energia aplicada no ato de vibrar a corda será distribuída em uma onda de formato esférico, que se expande gradativamente em todas as direções de acordo com a velocidade do som no ar. À medida que a esfera cresce e a primeira frente de onda (a superfície da esfera) avança, a energia aplicada no ato de vibrar é espalhada uniformemente sobre essa frente de onda. Como a corda mantém a vibração por um certo tempo, haverão frentes de onda subsequentes, cada uma sofrendo os mesmos efeitos que a primeira frente de onda sofre. Quanto mais longe o som se propaga, maior fica a frente de onda (superfície da esfera), mais dissipada fica a energia ao longo dessa superfície e portanto mais fraco fica o sinal sonoro, e por isso escutamos um som com menos intensidade quanto mais distantes estamos dele. De acordo com a física clássica, essa intensidade sonora deveria ficar indefinidamente pequena de acordo com a distância percorrida pela onda, sem limite de propagação enquanto existir ar para manter a onda. No entanto, de acordo com a física quântica, quando o ouvinte se posicionasse longe o suficiente do violonista, a energia retida na frente de onda seria tão baixa (devido à dissipação excessiva) que ela seria incapaz de excitar as partículas de ar subsequentes, e a onda "morreria". O sinal sonoro efetivamente morreria. O ouvinte estaria, portanto, fora do raio de influência sonora do violonista. Verdade seja dita, um sinal sonoro, de um modo geral, não é um exemplo adequado de um sinal quântico, pois um sinal sonoro envolve a vibração de muitos átomos, enquanto que a física quântica se preocupa com partículas individuais. Mas utilizei deste exemplo para tornar mais palpáveis as limitações que a quantização da energia impõe. Um de seus principais efeitos é de impor o limite do alcance de um sinal que se propaga em um meio. Ondas eletromagnéticas se comportam exatamente dessa forma: apesar de jamais se dissiparem no vácuo, elas se comportam de maneira perfeitamente análoga ao exemplo da onda sonora quando propagadas em meio material. Isso ocorre, por exemplo, em águas profundas, à mais de 200 metros, onde a luz não chega. A luz é totalmente absorvida pelas camadas superficiais de água.

Fora isso, existem muitos outros efeitos que a discretização da energia provoca que fazem com que, mesmo no vácuo, ondas eletromagnéticas não sejam detectáveis à distâncias muito longas. Por exemplo, devido à frente de onda de um pulso eletromagnético ser quantizada, à longas distâncias o sinal luminoso se torna "ralo", descontínuo. Muitas regiões do universo não chegarão a receber o sinal luminoso emitido de uma fonte qualquer de luz. Aqui, do ponto de vista quântico, observamos mais uma imposição limitante sobre a nossa capacidade de influenciar o "mundo" à nossa volta. De acordo com a física quântica, certos lugares jamais receberão nossos sinais. A nossa influência não atingirá esses locais. E para um ser humano, sinais quânticos tem um alcance particularmente curto!

Disto isso, temos agora o que podemos chamar de duas lentes: a visão macro, da Teoria do Caos, e a visão micro, da física quântica. A visão micro parece nos servir meramente para descrever o mecanismo fundamental de influência de um sistema sobre outro, enquanto que a visão macro é mais adequada para a apreciação de problemas com aplicação prática para nós, humanos. E é através dessas abordagens, especialmente a macro, que percebemos que a nossa influência não só é muito limitada, como é também complicada, sutil e muitas vezes imprevisível. Um indivíduo não é capaz, por conta própria, de assumir a total responsabilidade por uma grande mudança, apesar de que ele possa servir como estopim para uma, dadas as condições ideais. E essas condições, ideais ou não, dependem estritamente da interação de um número exorbitante de outros indivíduos e outros elementos constituintes do sistema. Grandes mudanças históricas não dependem só do ímpeto de uns poucos indivíduos, mas principalmente da conversão e ação simultânea de uma grande quantidade de indivíduos. Mesmo que alguns indivíduos sirvam como estopim para uma mudança, o sistema não pôde ter sido preparado para a mudança unicamente por responsabilidade deles, pois estes também receberam influência do sistema, por não serem isolados. Para entender mais sobre como um indivíduo pode ser colocado numa posição de estopim, leia sobre Criticalidade Auto-Organizada.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

ON NON-HUMAN PERSONS

To me, there's a clear difference between a person and a human being. Sometimes, we can see persons belonging in our culture that are not human. Jesus is treated as a person, though he's not human. In fiction and fantasy, aliens and sometimes robots are treated as persons, though they're also not human. Legally, corporations are can be treated like persons, though they're strikingly inhuman. Therefore, an urge can be felt to define the object "person" more broadly.

Dictionary.com promptly offers a very suitable alternative (as of Jan/2014):
"4. Philosophy . a self-conscious or rational being." So, in addition to mean human beings, such philosophical definition extends to entities that *exert rationality and own a well-defined, self-aware individuality*. Corporations, for example, have a very particular way to approach situations in a rational way, take responsibilities as an established entity and distinguish themselves from other companies and the rest of other persons (clients, inverstors, politicians etc). They are very self aware and, moved by market or social pressures, exercise empathy or egotism, as the very literally big and complex persons that they are.

The importance of this search for a renewed definition of the idea of a "person" stems from the cultural transition animal species as a whole are going through in these very times. Lead by humans, Earthling life forms are starting to be recognized as empathetic, rational, self-conscious entities that have enough in common with "human persons" in a sense that they inspire respect, lest we want to be inconsistent with our empathy for beings of the same species as ours. Simultaneously, we prepare for the possibilities of contact with extraterrestrial intelligence (and most prominently the want for such contact), and also prepare for the rise of artificial intelligence.

These last two cases, aliens and robots, inspire very intense and interesting reactions in us. These entities are predominantly portrayed in conflict with humanity, mainly oppressing humankind, but sometimes being oppressed by us. Works of fiction explore the notions of basic rights, privileges and emotions inherent to complex animals on planet Earth, which may be in discordance with the sociality of such inhuman entities. Often, humans are portrayed as fighting for their privilege to exist, amidst an universe of conscious entities, leaving behind "antiquated" notions of self and intelligence when needed for survival. These thought experiments demonstrate an urge for the preservation of intelligent, emotional life in its diverse forms, if not all life.

The consequence of not including these emerging intelligences within the "person" set  is tyranny. Not that tyranny is unacceptable by human social standards as of today, but it seems to be deemed as a "dated", inefficient posture towards sociology. Looking back in history, we note that the "dehumanization" of afro-descendants facilitated their slavery. Even an entire pseudo-scientific field, phrenology, was devised to purport the idea that the afro-descendant constituted a puny strain of the human species.  It may be argued that a similar form of discrimination is directed toward the poor and the criminals, so that arguments such as "[he/she] is not human for having killed another human, therefore is deserving of death" can be devised.

Whatever forces drive us to maintain the "personal status" within humankind, they are certainly hindering our cultural and scientific progress. As is with any biological force, its aim is protective and geared towards preservation of the family (the familiar pool of genes). We have broken many of these instinctive urges throughout or development as a society (we aren't hunters-gatherers anymore, for instance), and can only evolve towards complexity by surmounting these barriers that dominate simplistic societies. Before we gain hold of too much power for our theoretical understandings, we better make sure that no one is tyrannized as people were during periods such as slavery and the holocaust.